Crítica - Apartamento 7A (Apartment 7A)


Um dos maiores defeitos de um prólogo é se escorar nas qualidades artísticas e emocionais do original como palco de sustentabilidade. Dito de outra forma, o maior tropeço de filmes desse estilo é o próprio comodismo da parte dos envolvidos no projeto, por falta de criatividade, não passando pelo processo criativo íntimo que cada projeto deve passar. Ou seja, eles escrevem um rascunho medíocre que se escora num esboço clássico, e muito bem modelado, na intenção de desenvolver um vínculo emocional com o público por meio de um déjà-vu imagético. Isso não é uma regra que deve ser seguida de forma meticulosa, até porque é quase obrigatório um filme passar por essa peneira emocional e tácita com sujeito, memória e imagem — um laço amarrado pelas lembranças e fascínio.

Certas relações são formadas com o tempo. Tomamos maturidade e consciência de tais assuntos quando observamos com malícia, sem fanatismo nenhum. Se aplicarmos esse raciocínio no gênero, com o tempo percebemos que o terror e o suspense são alguns dos gêneros mais chicletes nesse aspecto. Mesmo que pensemos que seus elementos sejam por acaso, sinto uma certa malícia vinda de seus recursos linguísticos. Jumpscares, planos apertados e claustrofóbicos foram os ingredientes principais dessa massaroca que deu origem ao gênero. Se esse molejo for deslocado para um lado psicanalítico, vale lembrar também que o próprio gênero utiliza muito de uma fase ingênua e inocente de nossa vida, que é a infância. Com isso, o gênero lança uma corda e amarra suas pontas com muita força, usando esses elementos como cobaia para que esse vínculo seja criado logo cedo.

Nem sempre o terror será sinônimo de um medo cru. Esse é um dos maiores equívocos de um público leigo, que, ao ouvir a palavra "terror", já imagina uma sequência apavorante de um fluxo extremamente nojento e amedrontador. Mas não é bem assim que a banda toca. Eu ainda chuto que isso seja um dos motivos de filmes do gênero soarem genéricos na maioria dos casos. São obras que não pretendem expandir os limites estabelecidos pela formação do gênero no decorrer do tempo, e sim trabalhos que estão limitados, com receio de andar um pouco mais e acabarem se esbarrando e sendo dilacerados nos braços da crítica de cinema. Isso, porém, não significa que o filme precise se apresentar como complexo para que isso se torne sinônimo de qualidade.

Quer dizer, os chamados filmes pseudointelectuais passam por uma ideia de serem superiores somente por se apresentarem como herméticos do início ao fim. Mas, na maioria dos casos, são trabalhos que querem entregar tudo de uma vez só, mas se tornam extremamente vazios e sem um sentido propriamente sensorial. De certa forma, esse tesão da parte do cineasta e dos envolvidos cai numa fórmula barata de um egocentrismo que usa as fórmulas audiovisuais como objeto de transmissão.

Penso que, mesmo que cada gênero pertença a algo próprio, se acomodar nessas limitações, limita sua prosperidade futura. Para ser sincero, na minha opinião, um dos melhores métodos de subverter e criar novas incitações é usar os cenários, a mise-en-scène, como palco para o terror. De modo mais didático, a ambiência, a frieza que a narrativa criará a atmosfera que transpassa pelos personagens, criando uma aura que não necessariamente precisará de sustos, mas onde o oxigênio que aqueles personagens respiram é gélido, pavoroso.

É impossível tocar nesses assuntos sem citar Roman Polanski em O Bebê de Rosemary (1968), onde o terror não está somente nesses clichês gráficos, mas sim no modo em que Polanski desenvolve e cria uma perspectiva da vida da personagem de Mia Farrow que encaixa de modo íntimo com o espectador. Uma continuação cronológica é muito mais ligada a uma sequência que está disposta a agradar e não a renovar, a dar continuidade à origem. Acho muito mais interessante e inteligente da parte de Natalie Erika James deixar de lado o original para criar uma nova perspectiva com um filme prequel.


É importante lembrar que nem sempre esse fanatismo resulta em bons trabalhos. Vimos isso em Doutor Sono (2019), de Mike Flanagan, uma continuação que joga toda a originalidade dramática para o brejo, com esse clichê de embarcar na vida de um personagem depois de um evento traumático.

Apostar num prequel foi uma das melhores sacadas nessa dualidade entre o contínuo e o retrógrado, claro que Apartamento 7A (Apartment 7A) referencia e respeita o traçado de Polanski.

Terry Gionofrio (Julia Garner) é uma dançarina, uma bailarina que, após uma fratura no tornozelo, passa por momentos apertados em sua carreira e em sua vida pessoal. Ela acaba se mudando para o apartamento 7A de um edifício que parece comum, mas com pouco tempo acaba descobrindo que o local guarda segredos diabólicos. Com o tornozelo fraturado, os líderes dessa seita satânica acabam recrutando Gionofrio para ser a mamãe do anticristo.


O longa de Natalie Erika James é um exemplo muito proveitoso de quando os estímulos sensoriais, experimentais e psicológicos são doados em prol da arte. Eu não acho que um filme apegado ao original deve se limitar apenas a uma identidade primária. Mesmo que o prequel não fique nesse tesão estilístico de itens de mise-en-scène de O Bebê de Rosemary (1968), seria extremamente enfadante. Quando assistimos a um filme, mesmo que sejamos apaixonados pelo filme base, queremos uma reforma em suas estruturas, usando novas fórmulas que alavanquem a atmosfera que o filme base transmite.

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