Crítica - Depois de Horas (After Hours)

Eu acho que, se levarmos por uma dialética que conserve a cronologia de sua filmografia, Depois de Horas, lançado no ano de 1985, é um filme onde o próprio Martin Scorsese percebe a fraqueza de que, para o leigo, a força isolada de seus elementos não atinge o seu ápice sensorial imaginado.

A sensação que fica é que Scorsese não dirige um filme para seus amantes, ou até mesmo para aqueles que observam de relance seus manejos, e sim para atingir um sujeito que está começando a se relacionar com o cinema de modo não passivo.

É por esse motivo que vejo Depois de Horas (1985) como o trabalho mais maduro do baixinho. Ele não se debruça apenas na figura masculina como linha que ajuda a costurar o todo; nesse longa, ele entende — ou apenas se conforma — com o outro lado, que também serve como apoio para que essa figura central fique sempre em evidência. O arquétipo autoral feminino — a mulher loira — não apenas tange a mise-en-scène, mas encarna a força do desejo e da ruína.

Diferente da femme fatale do noir, que manipulava a narrativa para que o protagonista fosse conduzido à perdição, a loira scorsesiana é a catalisadora dos conflitos internos do protagonista, em boa parte, o homem enquanto figura masculina. O arquétipo do homem turrão é tragado e seduzido por uma imagem platônica.

E é esse domínio com a imagem que torna o banal em inventivo, pois aqueles personagens não só são parte da composição do quadro — eles estão longe de ser um simples fragmento —, eles estão ali basicamente para que exista uma identidade imagética quando vista de forma cronológica. Agora, aqui, ele abrange o uso dessas figuras para que não haja um protagonismo vindo de um só lado.

Mesmo que em O Rei da Comédia, de 1982, ainda se utilize da comédia como um elemento sólido do gênero, acaba servindo como tapete que é pisado por um clímax mais pujante. Já em Depois de Horas, não consigo mais ver isso, pois agora não temos mais um recurso de vitrine. Percebo uma confiança maior, também da parte do diretor, em não sentir repulsa de elementos bobinhos que acaba flertando em sua totalidade. Quer dizer, o diretor não repele o jocoso por receio de não pertencer mais a um cinema austero.

As horas em Depois de Horas formam uma camada muito incisiva quando levada ao externo — um tempo que vai acabar dialogando com seus erros e acertos autorais. A cena que dá abertura, em específico, remove, naquele momento, a relevância dos espaços que rodeiam o protagonista. Ou seja, esse plano expressa a ideia de que nada é tão importante quanto o personagem interpretado por Dunne. Esse tempo não se sobressai ao não ficcional; ele transborda para explicar como o tempo foi um fator determinante para o autor.



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