Crítica - Novocaine - À Prova de Dor (Novocaine)
Parece que, após Villains (2019), Dan Berk e Robert Olsen puderam ter uma regência maior com o humor físico e subversivo. Berk e Olsen já vinham flertando com o grotesco e com esse humor um pouco mais "palpável" em The Stakelander (2016), mas foi três anos depois que a dupla de cineastas conseguiu achar uma fórmula de misturar o horror de situações com o cômico dos corpos em cena, sendo assim um trabalho que serviu de vitrine e exibiu, para um circuito indie, que eles eram capazes de explorar o tenso por meio do cartunesco.
Novocaine - À Prova de Dor discursa de modo bem interessante com o cinema e os corpos que compõem aqueles espaços — espaços esses que, em primeiro plano, são narrativos e, em segundo plano, não narrativos. O corpo que está intrínseco à diegese é composto por uma fragilidade visível, mas que recusa essa pequenez por meio da força. O uso de montagem mais áspera traz uma didática muito lógica com o estado de espírito do protagonista, ao mesmo tempo que desenvolve camadas que derrubam por terra esse pressuposto de arbitrariedade. Removendo também todo um senso de mediocridade, a tensão das imagens não diminui Caine.
É bom ter em mente que essa fusão do cômico com o absurdo certamente oscilaria ao vitimismo se essa mescla não tivesse como papel higienizar. E, por incrível que pareça, esse pano também serve para que a roupagem heroica vestida por Caine não se rasgue.
O actante, em uma narrativa, tem um papel crucial na distribuição de carga dramática — e este filme usa seu actante como um recurso que coopera com toda a formação de Novocaine - À Prova de Dor. Acho bacana como esse conceito narratológico/semiotico não se torna um mero descarte, e sim um conceito que ajuda a dissecar os elementos (ideias, personagens, objetos) que funcionam dentro da engrenagem da trama. Por mais que, não necessariamente, um actante deva ser de carne e osso, Berk e Olsen padronizam essa ideia de modo mais claro: o actante aqui se forma na personagem de Amber Midthunder, tal personagem que acaba servindo como uma cartografia para o crítico esquematizar essa veia satírica intensa.
Por pouco o filme não se torna autopiedoso demais se os cineastas não apelassem para uma cartilha que instrumentaliza a doença de Caine. É ela que serve de apoio para uma ação sincronizada com o absurdo. Ao invés de martirizar o protagonista, a doença se torna um instrumento que transforma uma deficiência em força motora da ação.
E é por meio dos embates que Novocaine - À Prova de Dor se consagra como um filme de super-herói. As batalhas servem como uma anestesia que ameniza aquilo que é sentido pelos corpos não tangidos por aqueles espaços. O cômico também colabora para esse encontro, ao mesmo tempo que retira um senso que diminua seu herói.
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