Crítica | Laranja Mecânica (A Clockwork Orange)
O futuro distópico de Laranja Mecânica, trouxe apenas "culturais". Mas, o ser humano ainda não perdeu sua essência perversa.
Mesmo em um mundo lúdico e futurista, a sociedade ainda não perdeu o seu desejo ambicioso de fama e poder. Jovens rebeldes e delinquentes, têm um único papel perante a sociedade, o estudo científico e psicológico. Tal estudo que acarreta fama e dinheiro para os envolvidos do projeto, um projeto inovador e "bondoso" que promete acabar com mentes perversas e ruins. Mas será que há uma cura para a ambição humana?
Em uma Grã-Bretanha distópica e futurista, gangues de jovens delinquentes açoitam mulheres e cidadãos, entre essas trupes violentas, esta uma liderada por Alex DeLarge (Malcolm McDowell), um jovem culto e cruel que com seus "irmãos" aterrorizam cidadãos e mulheres com atos sexuais sujos e violentos. Alex é preso em flagrante em um do seus atos, e senteciado a 14 anos na prisão para jovens delinquentes. Mas pelo seu carisma e deboche, é escolhido para um procedimento que promete revolucionar a humanidade, o projeto Ludovico.
Stanley Kubrick nos trás uma ideia e sensação de mundo futurista mesmo sem mostrar evidentemente a cidade. A distópia e distorção mental humana está também em como Kubrick enquadra e filma os personagens. O diretor utiliza uma lente de distância focal baixa para trazer um aspecto distorcido do ambiente e os personagens, algo metódico e perfeccionista assim como todos os filmes de Kubrick, o mise-èn-scene e os personagens são muito bem posto nas cenas, um trabalho que pode soar como uma obra teatral pelo perfeccionismo e metodologia adotada pelo cineasta. Uma certa marca de sua filmografia, o metódico método em que Kubrick faz seus filmes, e como se cada cena fosse algo gravado e regravado inúmeras vezes, até alcançar a perfeição. Como se o diretor extraisse o máximo de cada ator e de cada filme, para chegar em algo até melhor do que a obra original.
Kubrick, parece estar em todo momento querendo nos mostrar as feições e personalidades dos personagens. Utilizando close-up, dramatizando a psique dos jovens e nos trazendo até uma certa sanidade mental não só dos jovens, mas com
todos os personagens, desde o morador de rua fracassado, à um padre católico. Os close-ups são como um artifício para tentarmos descobrir ou imaginar o que está se passando na cabeça de tal personagem, qual será o seu próximo passo ou ato.
O processo decupatorio de cada cena é algo muito bem feito e pensado pelo diretor, sinto que é algo feito incansáveis vezes. Os personagens nos traz uma certa fluidez de movimentos e falas, como uma peça de teatro, que não pode ter erros e sim ser tudo perfeito. A decupagem de Laranja Mecânica é algo fluido, natural, e pensado com maestria.
A metodologia de Kubrick em seus filmes, com certeza serviu como inspiração para cineastas mais tarde. Wes Anderson, se aproxima e lembra muito Kubrick. O modo como Anderson enquadra e decupa suas cenas, nos remete a filmografia de Stanley. A fluidez dos personagens, a fluidez dos diálogos e enquadramentos é algo até nostálgico para os fãs de Stanley Kubrick. A decupagem perfeita e ensaiada de Kubrick pode ter servido como base para cineastas posteriormente anos mais tarde.
É interessante como Kubrick consegue mesclar e mascarar algo nojento e pornografico em um filme sobre a psique. As vaias e boicotes que Laranja Mecânica sofreu em premiaçoes é um pensamento totalmente conservador e primitivo. Recusando a arte, e a menssagem que é passada através do cinema, tais ações feitas por pessoas que não tem o mínimo de senso interpretativo de o que é o cinema, e a diferença de uma obra-prima e um bom filme. Deixando o conservadorismo ultrapassar a magia que o cinema nos possibilita.
Mas, Stanley Kubrick foi genial em utilizar em evidência recursos esdrúxulos e banais em Laranja Mecânica, para nos impactar sobre as verdadeiras intenções da sociedade. Uma sociedade que não esta apenas posta por jovens infratores, mas também na elite. Uma elite que mesmo em um mundo futurista imaginário, não perde sua essência e sede de poder e fama. Utilizando a psicologia e a ciência, como um método de fama e poder.
O erotismo distópico é presente em quadros e pinturas de um modo muito evidente na mise-èn-scene. Um tipo de arte perversa podemos dizer, levando a imaginar que o mundo criado em Laranja Mecânica, é um mundo totalmente lunático e perverso. Um mundo em que o erotismo sexual está presente até no que há de belo e pleno na vida, a arte. As roupas excêntricas, ressaltam as partes íntimas dos criminosos, um recurso para mostrar vulgaridade e uma certa inquietação e falta de temor e receio dos jovens perante o sexo, como se no mundo lunático e futurista de Laranja Mecânica fosse algo sem pudor algum.
A distorção doentia da mente de Alex e de sua trupe, é presente em forma de música clássica. Alex e um grande fã de Ludwig Van Beethoven, a música clássica é um recurso utilizado em hospitais psiquiatras e hospícios. A intenção é tranquilizar a mente dos pacientes fazendo parte do tratamento. Kubrick faz uma sátira, uma piada sobre Alex e sua trupe, no ponto de vista de Alex e seus "irmãos", quando estão praticando seus crimes é como um ato prazeroso e normal, mas Kubrick diz o contrário. Fazendo uma piada de um bando de criminosos idiotas que estão pensando que são o poder e autoridade da cidade, mas não trata apenas de um bando de pacientes internados em um hospício, um hospício em forma de cidade. A loucura e falta de justiça tomou de conta de ruas e cidadãos, trazendo um mundo totalmente doente.
Assim como a maior parte da filmografia de Kubrick, Laranja Mecânica aborda a mente ou psique humana. Quando tocamos neste ponto de Kubrick e a psique humana, penso e sinto que o diretor não tinha fé alguma na redenção ou mudança humana. É como se o diretor utilizasse uma mente doente e degradante para mostra o quão prejudicial os nossos pensamentos e atos podem ser para nós mesmos. E como se a sociedade achasse "bonito" os atos cruéis feitos pela uma psique doentia, a cena final de Laranja Mecânica reforça este pensamento.
Entre ano sai ano, a humanidade ainda continua doente e podre. Para Stanley Kubrick e Anthony Burgess, a humanidade é decadente para todo sempre. Os dois partilham deste mesmo pensamento, um pensamento que resultou uma
obra-prima prima reflexiva e atemporal.
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