Crítica | Vidas Passadas (Past Lives)
Celine Song, traz uma perceptiva contemporânea que a sociedade tem em sua filosofia cultural e espiritual. Não podemos culpar problemas causados por nós mesmos, em vidas passadas. Na maioria dos casos, os problemas causados em nossa vida atual, são de nossa própria vida atual em que vivemos.
Indicado a melhor filme, no Berlin Internacional Film Festival 2023. A nova produção da A24, traz a história de um amor distante e enigmático. Após imigrar para Nova York, Na Young (Greta Lee), que agora tem seu nome alterado por Nora, está a procura do seu amor de infância, Hae Sung (Teo Yoo), que acabam o encontrando pela Internet novamente, para reconstruir um amor inacabado. Mas o otimismo, e o preconceito é algo que não é culpa do passado, ou de vidas passadas, e sim culpa de nós mesmos.
É um fato, que a premissa de Vidas Passadas (Past Lives), poderia cair no gênero de um drama romance simplório. Mas o seu significado espiritual na trama, é o ponto chave para uma imersão emocionante e reflexiva para o espectador, a cineasta Celine Song, consegue trazer uma narrativa realista e instigante para seu filme, o filme induze o espectador para uma dúvida sobre um passado que talvez nunca iremos saber o que verdadeiramente aconteceu. Mas, por mais que o significado explícito seja a reencarnação (ou vidas passasas), tacitamente, o filme traz um significado implícito muito profundo e pessoal, sobre o caráter dos personagens, e sobre suas ações tomadas pelo seu ego.
Por mais que o filme da cineasta, trate sobre vidas passadas (Reencarnação), o otimismo e a xenofobia contra a própria raça, é um defeito preconceituoso dos próprios personagens. Não acho que o amor inacabado e impossível de Nora e Hae Sung, seja por conta de suas vidas passadas. A personagem desde sua infância, se mostra ser uma pessoa invejosa, otimista e egoísta, ou seja, este comportamento de seu caráter, não tem nada a ver com suas vidas passadas, mas sim de sua vida atual. Segundo a doutrina espírita, se duas pessoas tinham um relacionamento, ou um laço familiar, isso se perpétua para todo sempre, chamado laços eternos. Mas, esse laço só poderá ser desamarrado se caso algum erro for cometido, um erro cometido por nós mesmos. E aí que entra outro tópico, segundo espíritas e outras doutrinas que creem na reencarnação, se caso algum erro ou falha, for cometida por nós mesmos em nossas vidas passadas, à nossa vida atual irá arcar com as consequências passadas, tal consequência chamada expiação. Hae Sung, a todo momento é tido como a "segunda opção" de Nora. Que está sempre pensando em sua vida profissional, e em seus benefícios como uma cidadã americana, que por nascer na Koreia, nao consegue ver sua vida como uma cidadã Koreana, se casando com um Koreano e trabalhando em seu país de origem. Podemos dizer que Hae Sung, é o bode expiatório de tudo isso, a pessoa que paga pelos erros e obsessões de seu "amor passado".
Celine Song, propõe uma perspectiva muito íntima para a vida dos personagens, mostrando o que Nora e Hae então fazendo em planos particulares e pessoais. A decupagem de Vidas Passadas, é uma viagem no cotidiano pessoal vivido pelos personagens, a sensação que temos é como se nada no mundo mais existisse, exceto Hae e Nora, e o amor sentido por ambos.
Um amor transmitido através de redes sociais, podemos pensar que após o auge tecnológico e o nascimento das redes sociais, o mundo passou por um afastamento social, um afastamento em que antes da tecnologia, as relações eram pessoais e cotidianas, mas após a chegada de tudo isso, o mundo passou por um relacionamento a distância em que antes, uma boa conversa era uma conversa olho a olho, hoje em dia é através de uma tela de vidro.
Em outras palavras, Vidas passadas é uma verdadeira obra de arte que produz este sentimento espiritual incógnitivo ao espectador. Pois não sabemos o real motivo espiritual de duas pessoas que se amam, e não conseguem viver juntas, por mais que o título do filme reforce esse pensamento explícito ou até mesmo nos dê uma certa explicação do por quê este fenômeno acontece em nossas vidas, na verdade nunca saberemos ao certo e nunca chegaremos a uma resposta final. A diretora consegue manipular os nossos próprios pensamentos e sentimentos, nos trazendo uma obra cheia de incógnitas espirituais sobre o amor.
Song, traz uma paleta de cores ímpar para cada personagem, reforçando a narrativa e nos trazendo um sentimento de distância, melancólia, abatimento físico e mental dos personagens. É como se cada um tivesse uma dependência emocional um do outro, e que tais decepções poderiam causar vícios ou doenças como, depressão, alcoolismo e tabagismo.
Um pensamento, materialista e nostálgico podemos dizer. Eu não acho que uma pessoa, seja a responsável por acabar uma vida inteira pela frente, mas o único ser que é capaz de destruir nós mesmo, somos nós mesmos. As vezes, procuramos subterfúgio e acabamos jogando à culpa de nossos atos, no passado. Considero isso como uma das doenças da humanidade contemporânea, pois não devemos achar pretextos para fazer atos maléficos que desejamos em nosso conciente, pois tudo isso, terá cicatrizes em nosso ser, em nosso futuro e no resto de nossas vidas.
Insumo, Celine Song consegue desenvolver muito bem, uma narrativa que seria óbvia e tediosa para filmes com a mesma temática narrativa, e filmes do mesmo gênero, a cineasta articula cada elemento da linguagem como um todo, ou seja, cada elemento usado no filme faz parte de um só tópico (assunto). Mas, é um filme que ficamos sem uma resposta plausível, ou uma resposta verídica. Tiramos interpretações de nosso conhecimento intelectual e audiovisual, para uma talvez explicação do que pode ter acarretado o distanciamento dentre duas pessoas. Quem disser que tem um resposta final para Vidas Passadas, está mentindo. A diretora abre esses caminhos interpretativos para que podemos abrir nossas mentes para a vida carnal e a vida espiritual. E essa é a magia do cinema.
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