Crítica - O Dublê (The Fall Guy)
É indiscutível que umas das profissões mais invisíveis e injustiçadas da sétima arte são os homens que se entregam nas periculosidades de um filme e, na maioria das vezes, indivíduos que trabalham em prol de um realismo fervente naquelas cenas, às vezes, uma concretude que não caminha numa linha pragmática. Por mais que, este filme comunique uma análise reflexiva sobre uma invisibilidade que é escondida atrás das câmeras, a minha intenção aqui é remodelar uma crítica por cima da própria crítica proposta pelo filme, assim, articulando uma nova maneira de enxergar algo "lacrado" e "intocável", no caso um filme. E, por mais engraçado que parece, na maior parte das vezes, aquela cena que chamou a nossa atenção não foi protagonizada por aquele ator, e, na minha opinião, a arte da atuação está muito mais enlaçada em entregar o máximo de suas habilidades diante de uma câmera, ou seja, não é só colocar o rosto em frente às câmeras, e sim, se submeter naquilo que o filme desejará transmitir.
O Dublê (The Fall Guy), dirigido por David Leitch é um longa-metragem que entrega aquela sede que temos de que as peripécias que são exibidas naquele filme sejam expostas, e diga-se de passagem que este filme propõe esse exibicionismo de modo bastante provocador e alegórico. A alegoria no cinema é uma das linguagens mais importantes quando a intenção é formular uma crítica notória ou tácita, ou seja, o simbólico serve como um meio interpretativo que irá expandir ideias robustas que, de uma certa forma, não pretendem sair de seu lugar conceitual. Isto é, um modo extremamente perspicaz de atingir uma moralidade crítica de um filme, a narrativa apenas servirá como um objeto que cobrirá o que está escondido entre linhas.
Não há dúvida de que existem filmes que pressupõem uma identificação lógica a uma filmografia em específico, no caso, uma filmografia que propõe certos assuntos, isso se evidência ainda mais quando somos treinados a avaliar prematuramente em primeiro instante aquela obra. Levando isso em consideração, O Dublê (The Fall Guy) considerará tudo aquilo que esperamos de um longa-metragem dirigido por David Leitch, claro, algo que associamos num primeiro momento quando sabemos que estamos assistindo a um filme dirigido por Leitch. O seu cinema é algo muito emblemático quando o assunto é ação, onde a mise-en-scène irá congelar para que o espetáculo maneirista seja salientado, um ilusionismo que se assemelha a um espetáculo teatral. Eu consigo enxergar um certo teor referencial que procura retroceder o cinema para o teatro, claro que tudo isso de modo estético, algo que também vimos em John Wick (2014), Atomic Blonde (2017), Deadpool 2 (2018) e Bullet Train (2022) aonde o cineasta procurou replicar todo o seu estilo para que outros filmes também partilhassem desse balé hipnótico. No fim das contas, o cineasta entrega novamente o seu olhar cirúrgico quando o assunto são espetáculos malabaristas que envolvem o gênero ação.
Um filme não está proposto a abordar apenas um assunto ou uma premissa em específico. É preciso de uma visão ampla que abra os espaços e que procura gesticular todas as membranas presentes em um filme, é por isso que sempre digo que – o cinema é uma arte antropológica que precisa de uma análise, ou melhor dizendo, uma autópsia que tenha em mente retirar aquele filme de seu lugar de descanso. E diga-se de passagem que esse é o trabalho essencial de um crítico de cinema, onde o indivíduo não está submisso a uma mera análise objetiva de uma obra, ou seja, o crítico de cinema procura uma objetividade totalmente diferente de uma análise cinematográfica. É interessante como, às vezes, o cinema procura manipular opiniões de um certo público, algo que vai pender para a psicologia e, neste filme tudo irá parecer que tomará um rumo que já imaginamos, David Leitch brinca com esses aspectos, ou até uma primeira sensação que temos, ou seja, sabemos o caminho que o melodrama vai traçar, mas mesmo assim, o cineasta desvia a própria narrativa com intuito de desviar as próprias opiniões e pensamentos que rodeiam sobre a mente do espectador. Enxergo isso como um modo de driblar uma concepção pré-pronta do gênero, isto é, somos surpreendidos, ou melhor, enganados pelo próprio gênero.
O diálogo do cinema e o corpo é algo que não apenas se faz presente no experimentalismo, e sim, em obras que pretendem trazer um calor poético para aquela atmosfera. Quando eu estava saindo da sala de cinema, meu irmão me disse que o cinema contemporâneo está muito mais preocupado em utilizar os próprios corpos dos personagens como um objeto artístico. Isso é totalmente verídico. Quando olhamos ao redor e nos deparamos com os lançamentos, temos que olhar. Rivais (2024) é um filme que se utiliza desses meios antropológicos como um objeto maleável de corpos que trazem um sensorialismo e uma alegoria ao sexo, que atingirá um protagonismo muito mais presente naquele filme: os corpos, fluidos corporais e relações sexuais. Se trazermos isso para esse contexto que está sendo comentado, O Dublê (The Fall Guy) vai realçar uma penalização por meio de atos, quer dizer, decisões que foram mal tomadas e que agora querem uma reconciliação, uma reconquista conjugal e profissional. Sinto que tudo é um contorno sutil que levará os personagens ao molde icônico do melodrama, onde eles vivem felizes para sempre! Fim.
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