Crítica - Uma Família Feliz




Somos seres humanos, somos errôneos e irregulares. Não é todos os dias que estamos dispostos a enfrentar as atividades cotidianas, o nosso próprio corpo implora por descanso enquanto temos um dia repleto de atividades que precisam ser concluídas. Em meio às adversidades e obstáculos rotineiros, procuramos pretextos para se esquivar do monótono, ou até para atingir uma felicidade, nem que seja um bem-estar momentâneo. Diante de tudo isso, as crianças são um espelho e a esperança para uma edificação que transforme o nosso mundo num lugar melhor, dentro de um mundo caótico e desvirtuado, a inocência infantil é algo que preenche espaços vazios, se tornando a agulha cirúrgica que costura um coração cansado e ferido. Tudo isso pode soar purista, ou até algo que pende para um conservadorismo social. 

Eu tenho um irmão de cinco anos de idade e, muitas vezes, meu caçula foi a razão de muitos sorrisos tirados do meu cotidiano, quer dizer, a falta de malícia presente no rosto de uma criança é um remédio extremamente eficaz para nossa saúde. E não é só a mim que cabe esse modo de enxergar isso, com toda certeza. — Uma vez na vida, já ouvimos que as crianças não mentem, mas será mesmo que isso é verdade?



Essas incógnitas se tornam muito ambíguas e relativas quando se trata de concepções pre-moldadas em nossa sociedade, a saber, isso vai depender muito mais de um ponto de vista, ou melhor, diversos pontos de vistas do que um ponto de vista em específico, variando de indivíduo para indivíduo. O modo em que o suspense percorrerá remete a muitos filmes de Alfred Hitchcock (1899-1980), na verdade, é muito mais uma certa homenagem do que traços idênticos. 

O que me chamou atenção é como o espectador irá partilhar daqueles atos malignos, o cineasta José Eduardo Belmont cria um vínculo muito íntimo com os personagens e com o próprio espectador, os planos-sequências e os close-ups criam um aprisionamento, morbidez e penitência crescente, claro, que tudo isso se encaixa em sentimentos, em específico, para aqueles personagens. Agora, com o espectador o cineasta cria uma espécie de investigação criminosa, aonde o espectador que presencia aqueles atos se torna o detetive que adentra naquela cena do crime, já o indivíduo que não está submisso aos dispositivos cinematográficos que constroem o poder imagético daquelas imagens, é aquele que arrisca a sua própria intelectualidade para retirar a veracidade daquela declaração. Inútil, tudo isso se tornará ineficaz, causados pela nossa inocência, somos manipulados e feitos de bonecos.

Em alguns momentos, Uma Família Feliz (2023) é um longa-metragem que beira ao experimental, para falar a verdade, um filme que é indeciso no que ele realmente deseja articular. Em última análise, Uma Família Feliz (2023) sugere uma reflexão sobre discursos solidificados em nossa sociedade, mas isso realmente deu certo? Se pensarmos no choque e na intensidade que esse discurso é, sim. Nesse longa-metragem, José Eduardo Belmont responde com a sua autoria audiovisual, aliás, em menos de vinte minutos sabemos que existe algum tempero característico que nos faz remeter aos trabalhos dirigidos por Belmont. Planos contemplativos, uma montagem com um ritmo lento e reflexiva e principalmente questões sociais, ou em outras palavras, questões psicológicas. 

José Eduardo Belmont é um diretor de cinema que trouxe como um método linguístico a ambiguidade e o enigmático como um meio que preenche que procura abordagens que procuram um percurso persuasivo e, na maioria das vezes, polêmico. Em Uma Família Feliz (2023), as metáforas irão se sobressair como um meio de identificação que o espectador se encontra, quer dizer, os bonecos que são construídos e costurados por Eva (Grazi Massafera), na verdade, somos nós, nós somos bonecos que são manejados e esculpidos.

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